Palavras

És paulista? 
Ah!, então tu me compreendes! Trazes como eu o luto em tua alma e lágrimas de fel no coração. Ferve em teu peito a cólera sagrada, de quem recebe na face a bofetada, o insulto, a vilania, a humilhação.

Minha voz, que entre cóleras se alteia, é tua dor também. Minha voz é murmúrio, é marulho, é o eco pobre, de sete milhões de angústias indormidas, e sete milhões de ódios despertados, através do pudor de todos nós.

"Minha terra, pobre terra", de Ibrahin Nobre




A Revolução não deveria terminar assim...
Depois que fossem os filhos, iriam os pais. depois que eles morressem, iriam as irmãs, as noivas. Todos morreriam. Mais tarde, quando alguém passasse por aqui, neste São Paulo deserto, sem pedra sobre pedra, levantando os olhos para o céu, haveria de ler, no epitáfio das estrelas, a história de um povo que não quis ser escravo.

Discurso inflamado em praça pública em São Paulo, por Ibraim Nobre, que clamou contra o final da Revolução: ...



Oração ante a última trincheira
http://ultimatrincheira.com.br/oracao_ante_a_ultima_trincheira.htm
Guilherme de Almeida

Agora é o silêncio...
É o silêncio que faz a última chamada...
É o silêncio que responde:
— "Presente!"

Depois será a grande asa tutelar de São Paulo,
asa que é dia, e noite, e sangue, e estrela, e mapa
descendo petrificada sobre um sono que é vigília.
E aqui ficareis Heróis-Mártires, plantados,
firmes para sempre neste santificado torrão de chão paulista.

Para receber-vos feriu-se ele da máxima
de entre as únicas feridas na terra,
que nunca se cicatrizam,
porque delas uma imensa coisa emerge
e se impõe que as eterniza.

Só para o alicerce, a lavra, a sepultura e a trincheira
se tem o direito de ferir a terra.
E mais legítima que a ferida do alicerce,
que se eterniza na casa
a dar teto para o amor, a família, a honra, a paz.

Mais legítima que a ferida da lavra,
que se eterniza na árvore
a dar lenho para o leito, a mesa, o cabo da enxada,
a coronha do fuzil.

Mais legítima que a ferida da sepultura,
que se eterniza no mármore
a dar imagem para a saudade, o consolo, a benção,
a inspiração.

Mais legítima que essas feridas
é a ferida da trincheira,
que se eterniza na Pátria
a dar a pura razão de ser da casa, da árvore
e do mármore.

Este cavado trapo de terra,
corpo místico de São Paulo,
em que ora existis consubstanciados,
mais que corte de alicerce, sulco de lavra,
cova de sepultura,
é rasgão de trincheira.

E esta perene que povoais é a nossa última trincheira.
Esta é a trincheira que não se rendeu:
a que deu à terra o seu suor,
a que deu à terra a sua lágrima,
a que deu à terra o seu sangue!

Esta é a trincheira que não se rendeu:
a que é nossa bandeira gravada no chão,
pelo branco do nosso Ideal,
pelo negro do nosso Luto,
pelo vermelho do nosso Coração.

Esta é a trincheira que não se rendeu:
a que atenta nos vigia,
a que invicta nos defende,
a que eterna nos glorifica!

Esta é a trincheira que não se rendeu:
a que não transigiu,
a que não esqueceu,
a que não perdoou!

Esta é a trincheira que não se rendeu:
aqui a vossa presença, que é relíquia,
transfigura e consagra num altar
para o vôo até Deus da nossa fé!

E pois, ante este altar,
alma de joelho à vós rogamos:

— Soldados santos de 32,
sem armas em vossos ombros, velai por nós!;
sem balas na cartucheira, velai por nós!;
sem pão em vosso bornal, velai por nós!;
sem água em vosso cantil, velai por nós!;
sem galões de ouro no braço, velai por nós!;
sem medalhas sobre o cáqui, velai por nós!;
sem mancha no pensamento, velai por nós!;
sem medo no coração, velai por nós!;
sem sangue já pelas veias, velai por nós!;
sem lágrimas ainda nos olhos, velai por nós!;
sem sopro mais entre os lábios, velai por nós!;
sem nada a não ser vós mesmos, velai por nós!;
sem nada senão São Paulo, velai por nós!


Nossa bandeira
Guilherme de Almeida



Bandeira da minha terra,
Bandeira das treze listas.
São treze lanças de guerra.
Cercando o chão dos Paulistas!

Prece alternada, responso
Entre a cor branca e a cor preta:
Velas de Martim Afonso,
Sotaina do Padre Anchieta!

Bandeira de Bandeirantes,
Branca e rota de tal sorte,
Que entre os rasgões tremulantes,
Mostrou a sombra da morte.

Riscos negros sobre a prata:
São como o rastro sombrio,
Que na água deixava a chata
Das Monções, subindo o rio.

Página branca pautada
Por Deus numa hora suprema,
Para que, um dia, uma espada
Sobre ela escrevesse um poema:

Poema do nosso orgulho
(Eu vibro quando me lembro)
Que vai de nove de julho
A vinte e oito de setembro!

Mapa de pátria guerreira
Traçado pela Vitória:
Cada lista é uma trincheira;
Cada trincheira é uma glória!

Tiras retas, firmes
Quando o inimigo surge à frente,
São barras de aço guardando
Nossa terra e nossa gente.

São dois rápidos brilhos
Do trem de ferro que passa:
Faixa negra dos seus trilhos
Faixa branca da fumaça.

Fuligem das oficinas;
Cal que as cidades empoa;
Fumo negro das usinas
Estirado na garoa!

Linhas que avançam; há nelas,
Correndo num mesmo fito,
O impulso das paralelas
Que procuram o infinito.

É desfile de operários;
É o cafezal alinhado;
São filas de voluntários;
São sulcos do nosso arado!

Bandeira que é o nosso espelho!
Bandeira que é a nossa pista!
Que traz no topo vermelho,
O coração do Paulista!


Ser Paulista
Martins Fontes

Ser paulista! é ser grande no passado
E inda maior nas glórias do presente!
E' ser a imagem do Brasil sonhado,
E, ao mesmo tempo, do Brasil nascente.

Ser paulista! é morrer sacrificado
Por nossa terra e pela nossa gente!
É ter dó das fraquezas do soldado
Tendo horror à filáucia do tenente.

Ser paulista! é rezar pelo Evangelho
De Rui Barbosa — o sacrossanto velho
Civilista imortal de nossa fé.

Ser paulista em brasão e em pergaminho
É ser traído e pelejar sozinho,
É ser vencido, mas cair de pé!





Calai protestos que em minha alma enjaulo
Ante a paisagem que daqui se avista
Esta terra ainda pode ser São Paulo
Mas esta gente já não é paulista.

Ibrahim Nobre